Ouvida por deputados, jovem abusada na colônia agrícola heleno fragoso também fez revelações sobre o crime
Tráfico de drogas, de mulheres e de armas. Os depoimentos do conselheiro tutelar de Belém Benilson Silva e da adolescente de 14 anos que foi abusada sexualmente dentro dos pavilhões da Colônia Agrícola Heleno Fragoso sugerem que estes três crimes são praticados na casa penal. A avaliação é dos deputados da CPI do Tráfico Humano da Assembleia Legislativa do Pará (Alepa), que ouviram os dois na tarde de ontem. A menina foi estuprada durante quatro dias por pelo menos cinco detentos. Por ter colaborado na denúncia do esquema ilegal que privilegia os presos do semiaberto, o conselheiro foi ameaçado de morte na última segunda-feira, no mesmo dia em que as primeiras reportagens sobre o caso foram divulgadas na imprensa.
O boletim de ocorrência para registrar o fato foi feito ainda na tarde de ontem, logo após a reunião com os deputados, na Divisão de Investigações e Operações Especiais da Polícia Civil (Dioe). Benilson Silva foi escoltado por uma viatura da Casa Militar da Alepa. Benilson, que está há apenas um mês e meio no Conselho Tutelar, detalha que recebeu três ligações de número restrito. "Foi uma voz de homem que ligou, dizendo que era para eu não me envolver mais no caso. Ele disse que sabia onde eu e meus filhos moramos, o endereço do meu trabalho e que eu poderia morrer se continuasse a dar entrevistas. Isto não me intimida, mas tomei precauções, como me mudar temporariamente e pedir para meus familiares ficarem atentos com situações suspeitas", destacou.
A Comissão de Direitos Humanos da Alepa vai requerer em ofício que seja garantida pela Secretaria de Estado de Segurança (Segup) a proteção ao conselheiro e também à adolescente, que vem dando muitas pistas a respeito dos acontecimentos dentro do presídio. Os deputados até cogitaram a hipótese de ela ser incluída no Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM), como disse o deputado Carlos Bordalo (PT), relator da Comissão de Inquérito Parlamentar. "Vamos pedir neste primeiro momento que sejam providenciadas duas viaturas, uma para acompanhar o conselheiro e outra para a jovem. Os dois são testemunhas fundamentais para as investigações da CPI e também da polícia. Ela poderá ajudar a produzir, por exemplo, o retrato falado da aliciadora, que inclusive já poderia ter sido providenciado", observou Bordalo.
As relações de tráfico humano puderam ser identificadas pela presença da aliciadora, que receberia dinheiro dos presos para levar as mulheres e também prometia às meninas a quantia de R$ 20,00 para que elas fossem ao local. Embora tenha aceitado receber a importância, a adolescente não imaginava que seria obrigada a manter relações sexuais forçadas com vários presos. "O dinheiro que eles arrecadavam com as drogas não ficava com a gente. Nós estávamos sendo vigiadas o tempo todo e vendíamos a maconha, cocaína e óxi deles para outros presos. A mulher que nos levou para lá ficava com uma parte. Deve ter ganhado, no mínimo, R$ 500,00", revelou a adolescente.
O paradeiro das outras duas adolescentes de 15 e 17 anos que estariam junto com ela nas sessões de agressão sexual ocorridas na casa penal ainda é desconhecido. Podem ter sido mortas ou fugido, o que é mais provável. No último domingo, após uma revista, os agentes penitenciários registraram no livro de ocorrências a presença de mais seis mulheres, todas adultas.
Mãe da adolescente muda de endereço
A mãe da adolescente de 14 anos deixou, ontem, a residência na qual morava há aproximadamente seis meses. Ontem à tarde, este jornal tentou falar com ela, que residia no bairro do Curió-Utinga, cujo acesso é pela avenida João Paulo II. Vizinhos informaram, no entanto, que ela não estava mais naquele endereço. O paradeiro dela é desconhecido.
Ontem vizinhos disseram que a adolescente de 14 anos pouco parava em casa e que era comum ela chegar acompanhada de representantes do conselho tutelar ou de policiais militares, que a encontravam em situação de risco pessoal e social. "Ela gostava muito de rua", disse uma moradora.
Ainda segundo esses relatos, a adolescente, quando localizada pelo Conselho Tutelar, dizia que era adulta e tinha 21 anos. A mãe, que tem ainda dois filhos pequenos, que também moravam com ela, conversava com a filha, para que ela mudasse de comportamento. Porém, a jovem acabava encontrando uma maneira de ir para a rua, ainda de acordo com os vizinhos.
Casa penal passará por uma inspeção na tarde de hoje
Os deputados da Comissão de Direitos Humanos da Alepa vão fazer uma inspeção hoje, às 15 horas, na Colônia Agrícola Heleno Fragoso. A finalidade da visita é coletar mais informações com o departamento administrativo, detentos e agentes penitenciários sobre as rotinas e as condições de infraestrutura e segurança do local. Informações podem servir de subsídio para denúncia ao Ministério Público do Estado (MPE).
O presidente da comissão que visitará a colônia, Edilson Moura (PT), explica que a intenção do grupo é saber o que é preciso ser feito e como os deputados podem interceder. "Queremos saber, por exemplo, se há recursos próprios para a construção dos muros e em qual prazo ele será feito. Vamos conhecer in loco qual nível de facilidade os detentos têm para ir e vir do espaço e também se existe mesmo superlotação e se há mesmo ameaças de morte aos agentes que decidem enfrentar os presos", disse.
O deputado José Megale (PSDB), que representou a base de apoio ao governo na reunião, está confiante que os culpados pelos desvios identificados na colônia serão punidos. "O Estado, mais uma vez, está agindo rápido para tentar resolver o problema. Em outro caso de grande repercussão que ainda está na mídia, o da prisão dos matadores do casal de extrativistas de Nova Ipixuna, várias dúvidas a respeito da eficiência da polícia paraense foram levantadas. Mas os resultados apareceram", comparou o deputado.
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